segunda-feira, 23 de março de 2015

Desafios da Segurança Pública: as Guardas Municipais. Por Eduardo Marcelo Silva Rocha*

Pontuado pela nova legislação das Guardas Municipais, o debate sobre municipalização da segurança pública toma corpo. Como em qualquer discussão inicial, termina por sofrer influência de fatores dispensáveis, que não somam muito – ou na verdade, diminuem a pertinência do tema, são lamentáveis – à melhoria da vida das pessoas.

Não sendo esse o foco, pois  o que não soma deve ser descartado, temos a oportunidade de fazer a discussão, afinal, o modelo de segurança pública  em vigor, em que pese sua Constitucionalização em 1988, foi definido em fins dos anos 60, sem grandes alterações até os dias de hoje.

Antes de mais nada, precisamos (vou insistir) despirmos dos preconceitos e maniqueísmos que tanto grassam nas discussões, quando se crê que somente é possível existir uma ou outra saída, sem a menor possibilidade de se construir outra opção, ou outras...

Apesar de não podermos utilizar simplesmente os modelos exatos adotados em outros países, dada as suas peculiaridades culturais que impedem, não podemos também, simplesmente descartá-los, pois também existem pontos de convergência que merecem ser considerados, ou melhor, devem.

Assim, por exemplo, buscando o exemplo de um país continental semelhante ao nosso, sabemos que nos Estados Unidos existem milhares de forças policiais, organizadas desde o nível Federal até o dos condados. Certamente, essa organização descentralizada específica daquele país não pode ser transplantada à nossa realidade, mas isto não significa que o entendimento do seu funcionamento, seus motivos e justificativas, além dos resultados alcançados, não devam ser avaliados, como modo de se retirar vivências que possam nos trazer algo a ser aproveitado, mesmo de forma experimental?

Em nosso caso, temos uma realidade posta, pois as GM´s são criação constitucional e estão ai organizadas e atuando em pleno vigor. Ao mesmo tempo, muito se questiona os resultados da segurança pública. A população é simpática a quem atende suas demandas e vemos esse tipo de atuação das guardas expandindo-se em nosso país.

A somação de esforços é válida e deve ser feita, pois a cada dia que passa vemos a sua necessidade. Nesse sentido, ainda vou mais adiante, os problemas públicos estão atingindo grau de complexidade que já exige não apenas a intensificação de esforços comuns, mas a multidisciplinar, como sugeri em meu último texto.

Mas algumas visões necessitam de ajustes, pois partem de interpretações forçosas da Lei, dificultando o debate. Um exemplo é interpretar uma previsão específica e restritiva da Lei (bens e serviços municipais),  de modo genérico, fazendo um tipo de silogismo desleal (“se são bens e serviço e a vida é o maior bem, logo temos competência...”).

Ora, claro que a vida é o maior bem, tanto o é que a Lei obriga as polícias a atuarem e permitem, não apenas às GM´s (ao menos antes de 2014), mas também a qualquer um do povo a “dar voz de prisão” e fazer a condução, o que não significa que esse popular passou a ter Poder de polícia (de restringir direitos) tal qual qualquer policial.

Neste diapasão, durante um programa “de rádio” no dia 19/03, que versava sobre  este tema, duas participações foram muito felizes em seu pragmatismo. Ambas, tocaram no ponto mais relevante: ao invés de se focar na luta jurídica por se delimitar mais espaço pra um ou pra outro, verificaram que a própria Lei já delimita o espaço de cada um e que essa luta por espaço parece desnecessária e até, em certos casos, prejudicial.
Para tanto, disseram duas coisas:

1 – que os logradouros municipais poderiam ter a atuação das guardas mais presentes, uma vez que feiras livres (devido a circulação de dinheiro) são focos de ocorrências, que as praças públicas também exigem atenção especial, por também atraírem delitos (usou o exemplo notório da praça do siqueira);

2 – que de nada adianta uma disputa impensada, pois o saldo pode ser mais prejudicial que favorável, pois de nada interessa à sociedade ter, ao mesmo tempo  e no mesmo lugar, uma equipe da polícia e outra da guarda, quando existem locais outros que estão sem nenhum tipo de proteção;
Portanto, não há nenhuma intenção aqui de esgotar ou explicar o tema como um todo (lembremos: não sejamos maniqueístas), mas sim em contribuir com o debate.

O que podemos ter certeza, sem medo, é que o processo de aperfeiçoamento da sua atuação é uma realidade que precisa ser mais debatida. De forma sincera e sem oportunismos pessoais e políticos. Se assim não for, todos perderão. Além disso, esse momento parece ser bastante adequado.

Afinal de contas, se estão se organizando em movimentos exigindo esse aperfeiçoamento, ao ponto de criar uma série de eventos, inclusive indo às ruas, ela precisa dizer a sociedade o que quer e o como isto se reverterá em benefícios de volta à vida cotidiana da cidade – ou, melhor dizendo, das cidades.

Resta aguardar algo como um exercício de Democracia entre Estados e Municípios.

PS. Sobre guardas municipais e identidades, vide https://omologato.wordpress.com/2013/10/24/desafios-da-seguranca-publica-guardas-municipais-e-identidades/

*Capitão PM

Nenhum comentário:

Postar um comentário